Sessão de Terapia


Nossa avaliação

Como tornar sessões de psicanálise atraentes para o público televisivo? Selton Mello assume o desafio na direção da série “Sessão de Terapia”, que teve sua estréia no dia primeiro de outubro no canal GNT. Trata-se da adaptação brasileira da série israelense “Be Tipul”, de 2005. “Sessão de Terapia” consiste no trabalho do psicanalista Théo, que recebe, a cada dia da semana, um paciente em seu consultório.

A primeira temporada possui 45 episódios de 25 minutos de duração cada, os quais são exibidos sem intervalos comerciais e organizados de acordo com o dia da semana. Às segundas, o terapeuta recebe Júlia (Maria Fernanda Cândido), uma médica anestesista com problemas de relacionamento amoroso, que se declara, no primeiro episódio, apaixonada pelo próprio terapeuta. Terça é dia de Breno (Sérgio Guizé), atirador de elite que matou acidentalmente uma criança durante uma operação policial. Às quartas, Théo recebe Nina (Bianca Müller), uma ginasta adolescente que passa pelo processo de amadurecimento e revela um relacionamento amoroso com seu treinador. Às quintas, Ana (Mariana Lima) e João (André Frateschi), um casal em crise que lida com a gravidez indesejada pela mulher. Às sextas, Théo (Zécarlos Machado) vai à terapia que é conduzida por Dora (Selma Egrei), sua antiga supervisora.

O desafio lançado em 2005 com “Be Tipul” foi superado. Desde então, mais de 30 adaptações foram realizadas, dentre elas, versões para a Argentina, Canadá, Croácia, Hungria, Polônia, Romênia, Holanda, Sérvia, EUA.  Todas conservam os mesmos personagens e trama, porém com pequenas adaptações culturais. Na versão original, por exemplo, o paciente de terça é um piloto militar, filho de sobreviventes do holocausto, que entra em crise por ter bombardeado um prédio palestino, matando civis. Em “In Treatment”, versão norte-americana, Alex é piloto do exército dos EUA e sofre o trauma de uma missão mal sucedida no Iraque.

Desde sua primeira versão, o formato é recebido com desconfiança, afinal é tarefa difícil desenvolver uma narrativa estruturada em dois personagens (o terapeuta e seu paciente), único cenário, poucas variações de câmera e enquadramento, a maior parte, primeiros planos. Recursos como o flashback, elipses e gravações externas são dispensados, os episódios ocorrem como se fossem no tempo real de uma sessão. Enfim, uma dramaturgia televisiva baseada no trabalho de atores e por esse motivo, com tendências mais teatrais que televisuais.

Os acertos de “Sessão de Terapia” se dão pela escolha do elenco e, é claro, da direção. Selton Mello tem se revelado um grande diretor (vide “O Palhaço“), além de possuir mais de trinta anos de experiência como ator, o que provavelmente contribuiu muito para a execução da série. As atuações são boas e cumprem suas funções. Zécarlos Machado, que incorpora o terapeuta, vem de uma carreira teatral. Talvez por isso tenha se adaptado bem a esse tipo de dramaturgia televisiva, apesar de ainda carregar alguns cacoetes do teatro, como a voz um pouco forçada e os movimentos ligeiramente mecanizados. A atriz iniciante, Bianca Muller não deixa nada a dever na pele de Nina. Maria Fernanda Cândido, que interpreta Júlia, transforma-se em uma médica mais sensual do que a personagem em versões anteriores.

Os episódios de quinta com o casal Ana e João se destacam, provavelmente por serem mais dinâmicos e trabalharem com a interação entre três e não dois atores. O terceiro personagem parece libertar a câmera da rigidez da articulação de plano e contra-plano na gravação dos diálogos. Além disso, o drama do casal é fascinante. Após cinco anos de tentativas frustradas de fertilização, Ana e João, já em crise, encontram-se diante de uma gravidez que já não faz tanto sentido. A criança, indesejada pela mulher e pretendida pelo marido, é o fato que desencadeia o desvelamento de outras questões não menos profundas na vida do casal. De fato, quinta-feira é o clímax da semana.

Às sextas, Théo tem um encontro com sua tutora, Dora. Fatos ocorridos na semana, tanto os profissionais quanto os pessoais, são abordados. É revelado o outro lado da moeda: o terapeuta que lida com seus próprios fantasmas e com sua dificuldade de tratar as neuroses de seus pacientes. A terapia de Théo com Dora esquenta quando Clarice (Maria Luisa Mendonça), mulher de Théo, passa a freqüentar as sessões numa tentativa reerguer o casamento.

O tom voyerista da série seduz o espectador. Longe da auto-ajuda, “Sessão de Terapia” conduz a narrativa de forma simples, com textos bem feitos, bons atores e personagens profundos. Realmente é o bastante. Afinal, a humanidade e suas neuroses são material rico o suficiente para fisgar nossa atenção sem a necessidade de pirotecnias.

 


2 respostas para “Sessão de Terapia”

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