A Hora Mais Escura

Mulher e pátria em sobreposição nada sutil

Nossa avaliação
Zero Dark Thirty (2012)
Zero Dark Thirty poster Direção: Kathryn Bigelow
Elenco: Jason Clarke, Reda Kateb, Jessica Chastain, Kyle Chandler


No dia dois de maio de 2011, o presidente dos Estados Unidos,  Barack Obama, confirmou a morte do homem mais procurado do mundo: Osama Bin Laden.  O líder da organização al-Qaeda, responsável pelos ataques de 11 de setembro, foi localizado após dez anos de uma caçada da CIA sem precedentes e morto por soldados especiais do exército norte- americano.

É esta busca por Bin Laden que “A Hora Mais Escura” pretende mostrar em seus quase 160 minutos de duração. O filme já estava em produção (com foco na busca sem resultados pelo terrorista) quando Obama fez seu histórico pronunciamento, e a diretora Kathryn Bigelow e o roteirista Mark Boal precisaram fazer mudanças na produção para se ajustar à realidade. E é este clima de atualidade, quase jornalístico, que torna tudo tão interessante.

Há um sentido de urgência na caçada a Bin Laden que é reforçado pelo nosso tempo presente e nossa vivência contemporânea aos acontecimentos do filme. Bigelow segura a tensão de forma impressionante (apesar de não nos fazer trincar os dentes como em “Guerra ao Terror”), e sem pressa vai montando um gigantesco quebra-cabeça em nossa companhia. O roteiro tem o mérito de conseguir ligar todas as narrativas de forma orgânica (apesar do excesso de nomes de suspeitos confundir um pouco) ao usar a personagem Maya como elo: ela é a jovem agente da CIA que vai acabar fazendo de sua busca pelo criminoso uma obsessão.

Jessica Chastain mistura fragilidade e determinação em sua composição, ilustrando de maneira sutil, mas eficiente, a transformação pelo qual a personagem vai passando (se no início mal consegue encarar uma sessão de tortura, depois já está bem acostumada à prática). Mas apesar disso, o arco dramático de Maya acaba sendo aquilo que enfraquece a história, já que coloca a caça a Bin Laden como uma vingança pessoal, apelando para o drama em busca de uma identificação com o espectador que enfraquece a força daquilo que presenciamos. O resultado é o oposto do esperado: ao forçar a identificação com uma personagem de caráter duvidoso, a obra se torna impessoal, nunca conseguindo estabelecer uma verdadeira conexão com o público.

Mulher e pátria em sobreposição nada sutil

Por outro lado, é compreensível esta opção pelo lado pessoal, uma vez que os Estados Unidos buscavam o terrorista por vingança, uma forma de catarse coletiva que pudesse diminuir a dor pelo 11 de setembro. E nesse sentido Maya representa muito bem o seu país: em uma cena bem significativa ela sofre – com várias outras pessoas – um atentado em um restaurante no Paquistão e simplesmente ignora os outros feridos, ajudando apenas a colega americana. Há um “individualismo coletivo” nas atitudes da heroína do filme que coloca em xeque toda a atuação da CIA no processo.

Pois o que “A Hora Mais Escura” acaba nos mostrando é que, assim como a al-Qaeda, a Agência de Espionagem dos Estados Unidos é também uma organização terrorista, que tortura e assassina civis, mulheres e crianças se isso for necessário a seus propósitos. Afinal, existem heróis naquela situação? A morte de Bin Laden vai tirar o mundo da escuridão?

Bigelow parece acreditar que não, usando luz e sombras o tempo inteiro, como se o final esperado pudesse iluminar o universo ali construído. Mas a luz nunca chega por completo e a mesma dor e penumbra que abre o filme também o encerra.

Só por questionar o sentido de tantas mortes “A Hora Mais Escura” já merece muita atenção. Trazer um brilhante clímax noturno que vai fazer seu coração disparar é só a cereja do bolo.


3 respostas para “A Hora Mais Escura”

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