Sem Dor, Sem Ganho


Nossa avaliação
Pain & Gain (2013)
Pain & Gain poster Direção: Michael Bay
Elenco: Mark Wahlberg, Dwayne Johnson, Anthony Mackie, Tony Shalhoub


É atribuída ao escritor de romances de espionagem Tom Clancy uma famosa frase a respeito da narrativa artística: “A diferença entre ficção e realidade é que a ficção tem que fazer sentido”. A história – real – de “Sem dor, Sem Ganho” vai bem por aí. Trata-se de algo tão absurdo que, se não fosse verdade, seria acusado de ser uma ficção inverossímil.

Em 1995 três marombeiros de Miami resolveram sequestrar um empresário e acabaram assumindo os bens do homem, além de deixá-lo à beira da morte. Mas não parou por aí, e foram se acumulando situações improváveis e sangrentas envolvendo os três patetas psicopatas vividos no filme por Mark Wahlberg, Dwayne Johnson e Anthony Mackie. Com algo tão estranho/bizarro/perturbador em mãos, o diretor Michael Bay parece apostar no poder da história real para prender o público, ficando livre para as mais variadas experimentações narrativas (ou talvez ele seja só incompetente mesmo): há várias narrações em off de diferentes personagens oferecendo diferentes pontos de vista (o que dificulta uma identificação do espectador com qualquer um deles), uso de metalinguagem (apesar de legendas como “isso ainda é uma história real” funcionar como comédia, acaba por tirar o foco da ação que se desenvolve na tela), imagens belíssimas (que não combinam com o tom da história contada), nudez, drogas, violência e montagem modernosa.

“Sem Dor, Sem Ganho” nunca se leva a sério, e apesar das consequências trágicas das ações do trio de protagonistas, o formato voltado para o humor negro poderia funcionar muito bem. Mas Bay está longe de ser Tarantino ou até mesmo Danny Boyle: além de ter a sutileza de um The Rock em uma loja de porcelana, ele continua filmando todas as sequências como se fosse clímax e tudo é jogado de forma direta demais.

Mas apesar dos pesares, há alguns bons momentos surreais, e o elenco principal faz bem o papel de cabeças de vento malhados, enquanto Ed Harris despenca do nada como um detetive noir que nada tem a ver com o clima do filme (mas que funciona ao causar graça pelo embate de gêneros). Há um subtexto crítico aos Estados Unidos atual que nunca é muito bem explorado, mas interessante para se pensar uma autocrítica norte-americana em que eles talvez se vejam como estes super-homens endividados: força bruta e vontade de “fazer acontecer” em uma terra de não mais tantas oportunidades assim. Bay tenta mostrar isso de forma quase didática, com diálogos expositivos e muita bandeira do país; da mesma forma que as citações a filmes feitas pelo personagem de Wahlberg (e depois abandonadas sem explicação) dão a dica de que a história é absurda demais para ser tratada com realismo. Mas mais uma vez, a falta de sutileza estraga o que poderia ser uma experiência bem interessante no cinema.

Ao mesmo tempo em que se apoia no poder de sua história real para buscar alguma novidade em sua forma narrativa, o diretor parece não confiar de todo na premissa e investe na redundância de cenas explícitas demais, que esvaziam o sentido do choque exatamente por serem desnecessárias (o conteúdo – a história real – já deveria ser suficientemente poderoso). O resultado é algo desconexo, que não se decide entra a comédia que pisca o tempo todo para a plateia e a ação sádica que quer ser marcante. A falta de equilíbrio, somada à dificuldade de identificação com os personagens, faz de “Sem Dor, Sem Ganho” um reflexo exato de seu trio principal: uma montanha estética anabolizada sem nada por dentro.


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