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“dias sim, dias não...â€

Diário de Bordo - Tiradentes 2006

por Daniel Oliveira

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Quinta-feira, 26 de janeiro 2006

Para quem sentiu falta deste editor perdido em Tiradentes, arrumei tempo para uma passada rapidinha. No último sábado, foi exibido o longa A máquina por aqui. No elenco, Gustavo Falcão e Mariana Ximenes (que deu as caras na cidade histórica, causando a maior comoção tiete do festival até agora) e Paulo Autran protagonizam uma bela história de amor, baseada em livro e peça já consagrados. Nordestino, diálogos rápidos, estética colorida. Co-produção de Guel Arraes. Dificilmente perde o júri popular.

No mesmo dia, foi exibido o longa Carreiras, de Domingos Oliveira (Feminices). Ficamos conversando sobre esse filme, realizado em digital e praticamente com uma única atriz (Priscila Rozenbaum, mulher do diretor), por dias. Simplificando, é a história de uma âncora substituída por uma jornalista mais jovem. Gostando ou não de um certo desleixo técnico do longa, foi um dos mais instigantes até agora, porque é impossível ficar indiferente às loucuras da protagonista. Talvez um pouco made for communicators demais.

Ontem passou um filme com o filho da Marília Gabriela que apresenta o Contemporâneo da GNT. O nome é Quarta B, dirigido por Marcelo Galvão, sobre a classe-título, em que é encontrado um (enorme) tijolo de maconha. Estética Dogma 95, diálogos afiados na primeira metade, viagens maconheiras na segunda. O público adorou. O tal filho da Marília é o pior do filme.

Nos curtas, limito-me a citar quatro nomes imperdíveis: Eletrodoméstica, de Kléber Mendonça Filho (PE); Desejo, de Anne Pinheiro Guimarães (RJ); Ãmpar par, de Esmir Filho (SP); e Rapsódia para um homem comum, de Camilo Cavalcante (PE).

IMPERDOÃVEL: Não baixar uma das melhores músicas que eu ouvi nos últimos tempos - Eu queria morar em Beverly Hills, de uma banda pernambucana chamada Paulo Francis foi pro céu. Sen-sa-cio-nal. Eu volto aí depois.

Sexta-feira, 27 de janeiro de 2006

...é, choveu um pouco ontem, mas o calor continua infernal. Com a chuva, o documentário Moacir Arte Bruta, do Walter Carvalho, que seria exibido na praça, foi para a tenda do Largo da rodoviária. Resultado: assisti a três filmes seguidos. O primeiro, Serras da desordem, foi o primeiro longa metragem em película do Andrea Tonacci, desde os idos de 1975. O cara é diretor de Bang bang - um dos marcos do cinema marginal brasileiro, e não a novela-catástrofe.

Serras é a história de um índio que sobrevive a um massacre, é separado de sua tribo e roda o interior do Brasil, antes de encontrá-la novamente. Baseado em uma história real, o filme mistura documentário e ficção, é enorme e bem a cara do Tonacci: bem editado e demanda ser assistido umas boas vezes para ser melhor digerido.

Depois veio o tal Moacir, um cara do interior de Goiás que faz altos desenhos macabros, de demônios, vaginas e afins. Interessante, mas podia bem ser um curta. E, finalmente, Incuráveis, do carioca estreante Gustavo Acioly. Inspirado na peça A Dama da Lapa, o filme é protagonizado por Fernando Eiras e Dira Paes (2 filhos de Francisco), que o carregam nas costas, já que se trata basicamente de um diálogo cíclico entre eles. Alguns espectadores não gostaram porque a história não se responde totalmente ao final. Mas Eiras e Paes estão muito bem e o roteiro e direção são afiados - vale a pena. Talvez role uma coletiva com Eiras mais tarde. Vamos ver.

Ainda hoje, Crime Delicado, o novo de Beto Brant (O invasor). Eu volto aí depois.

Sábado, 28 de janeiro de 2006

Quem visse o cine-tenda da Mostra de Tiradentes ontem, mais de meia-noite (o que já seria hoje, mas enfim), depois de um pequeno temporal, completamente abarrotado de gente, poderia imaginar que ali seria exibida a final antecipada da copa 2006. Não era.

A sessão de Crime delicado, novo e aguardado filme de Beto Brant era um dos grandes atrativos da mostra neste ano, mas acho que nem os organizadores esperavam tanto. Era gente entrando sem parar e, por um instante, você achava que não caberia mais. Mas coube. Grande parte desse público, porém, deve ter saído da tenda desapontado ou, no mínimo, com uma baita dor de cabeça.

Crime delicado é Beto Brant, sim, mas é um Beto Brant amadurecido e difícil. Muito. A história de um crítico de teatro, uma musa, um pintor e um possível estupro é quase impossível de ser digerida na primeira assistida. Ainda preciso vê-lo umas duas ou três vezes para decidir se gostei ou não. A forma escolhida por Brant para seu filme reflete a forte presença do teatro na trama, com planos e enquadramentos únicos para cada cena. Acredite: assistir a isso à meia-noite, depois de dois documentários, é duro. Mas fiquei meio hipnotizado pela história e não dormi.

Hoje teve encontro da crítica e público com as duas atrizes do filme - Lilian Taublib e Maria Manoella. Beto Brant e o ator e produtor Marco Ricca não vieram. Mas o que vale citar desse bate papo, por enquanto, é: A Veja é uma revista escrota, a Isabela Boscov não é escrota, mas a crítica dela pra Crime Delicado é escrota (EDUARDO, Cléber, 2006 - crítico da revista Época). No que ele foi acompanhado por grande parte dos presentes. Mas isso, se você não sabe, já devia saber: não leia Veja.

Por fim, o filme que arrebatou grande parte do público ontem foi o documentário Morro da Conceição. A diretora Cristiana Grumbach subiu o morro do título e conversou com velhinhos descendentes de portugueses que, de certa forma, colonizaram aquela parte do Rio de Janeiro. O filme é filho descarado de Eduardo Coutinho (O fim e o princípio) e tem momentos de uma delicadeza surpreendente para uma documentarista estreante. Hoje tem Eu me lembro, do baiano Edgar Navarro, precedido de encontro com a crítica. O filme foi o grande vencedor do Festival de Brasília. E tem o encerramento do festival, pra gente ficar sabendo do quê o público gostou mais.

Eu volto (pra BH) depois.

P.S.: Ninguém é de ferro.

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