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10 de outubro – Passada rápida

Sete e quinze da noite

por Rodrigo Campanella

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Os primeiros dias de uma mostra dão aquela sensação que você vai ter tempo de ver tudo, de pensar em tudo, até vai ser possível sair de lá, parar em um boteco e ainda chegar em casa e colocar no dvd um Cronenberg da vida.

Os últimos dias de uma mostra, ainda mais se você trabalha de manhã, são uma mistura de vontade, cansaço, cafeína em formas variadas e humor variável – mas enquanto ainda der pra soltar umas risadas a troco de nada, sinal de que está tudo ok.

“Casa de Pássaros†hoje à tarde, na Humberto Mauro, foi o lugar das minhas primeiras pescadas. Sala escura, quatro da tarde, sabendo que vou ficar até depois das onze vendo filme, imagens fixas, ritmo lento... É, complicado. Mas endireitei na cadeira e o restante do filme viu meus olhos bem abertos.

O filme vem da Malásia, dirigido por Kho Eng Yow. Infelizmente o dvd exibido na Humberto Mauro deixou a imagem cheia de pixels, no limite do suportável – como já aconteceu também ano passado em filmes do Indie. A tela muito grande da Humberto e filmes gravados em formato de pouca resolução realmente não combinam.

Dá para entender “Casa de Pássaros†como a história de uma casa, contada através dos que vivem nela – um pai e seus dois filhos. A casa é enquadramento e presença em cada cena (apenas uma é gravada fora do lugar). E o laço e o plano de cada um para aquele lugar é que diz tudo sobre aquela família, com ecos bem altos sobre os rumos econômicos e sociais do Oriente – os países abandonados, as economias quebradas que ficam para trás, o dinheiro em fluxo passando por cima de tudo.

A casa está morta, só que ninguém parece perceber. Ela se torna um bem vendável, e morar nela vai se tornando um incômodo. De certo modo é sobre nós, urbanos e urbanóides, virando turistas (no mau sentido) do nosso próprio passado, das nossas próprias cidades e cotidianos.

Talvez ver tudo isso exija pensar bastante. Não é um filme que te leve, é daqueles que precisam de muita condução de quem assiste – e que tem uma coleção de enquadramentos muito bonitos, especialmente um sótão no escuro.

Mas o que eu senti mesmo foi saudade (e vestígios) de Apichatpong Weerasethakul, o tailandês que dirigiu “Mal dos Trópicos†e “Síndromes e o Séculoâ€, os dois inéditos no Brasil. Foi nesse “Casa de Pássaros†que eu que consegui entender perfeitamente como os filmes de Apichatpong batem em mim – filmando uma cena por tanto tempo, e algo que boa parte das vezes é tão aparentemente sem sentido, que em certo ponto o tempo se quebra e você já não assistindo um filme, mas o filme é que entrou na vida, é ele que pulou da tela e tomou tudo em volta. A cena de um dos irmãos jogando videogame no quarto dessa “Casa†é puro Apichatpong – mas ela termina antes do tempo entornar e chama para a realidade pé-no-chão, como faz esse filme o tempo todo. O filme é bom – mas também é, eu acho, uma oportunidade perdida para correr riscos gigantescos que ficam rondando ali todo o tempo.

E isso era pra ser um post rápido.

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