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O agosto português

23.09.09

por Daniel Oliveira

Aquele querido mês de agosto

(Portugal/França, 2008)

Dir.: Miguel Gomes
Elenco: Sônia Bandeira, Fábio Oliveira, Joaquim Carvalho, Manuel Soares

Princípio Ativo:
metalinguagem

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“Fazer um filme é como viajar numa diligência no velho oeste. No começo, você espera uma viagem agradável. No final, quer apenas sobreviver.â€

“A noite americanaâ€, clássico metalingüístico dirigido por François Truffaut em 1973, revelava as agruras e imprevistos escondidos por trás da perfeição de sentido assistida nas salas de cinema. “Aquele querido mês de agostoâ€, dirigido pelo português Miguel Gomes em 2008, é um filho - talvez um irmão mais novo - riponga do longa do mestre francês. Vencedor do prêmio da crítica no Festival de São Paulo do ano passado, “Agosto†começa como um documentário, torna-se uma ficção e termina como uma grande discussão sobre o que o cinema é, o que ele pode ser e como é feito.

Gomes dá um passo para trás do enquadramento perfeito, da emoção capturada e da trama verossímil para mostrar como é feita a “linguiçaâ€. Seu filme se inicia com uma série de entrevistas com moradores de pequenas vilas do interior de Portugal, que contam causos intercalados por shows de “bandas de baile†tradicionais da região. Conhece-se o jornal local, a fé, os costumes, as tradições. O pulo do gato vem quando, após uma discussão do produtor com o diretor (que havia entregado um roteiro e prometido um romance), o filme se torna uma ficção. E tcharan: todas as pistas e informações contidas no documentário inicial são embutidas na trama, trazendo o famoso “efeito de realâ€.

Uma das metáforas usadas para descrever o cinema é um quebra-cabeça em que várias peças, aparentemente isoladas, unem-se num todo coeso. Em “Aquele querido mês de agostoâ€, o diretor Miguel Gomes apresenta primeiro cada uma das peças ao espectador e permite que ele as vá encaixando à medida que a história se desenvolve. Quase coerentemente com o que o filme pretende dizer, a trama ficcional é bem ordinária. Seus melhores momentos são nas intervenções das tradições locais e dos elementos trazidos por aquela pesquisa inicial.

A utilização de habitantes da região no elenco também gera ótimas discussões sobre o trabalho de atores não-profissionais e a interseção de suas vidas com os personagens. O que resulta na cena mais bonita de “Agostoâ€, quando Sônia Bandeira, interpretando a protagonista Tânia, chora a partida de outro personagem. As lágrimas se transformam numa risada inesperada, sem ficar claro por que, nem se o choro é de Sônia ou Tânia. A sequência, que lembra Giulietta Masina no final de “Noites de Cabíriaâ€, é a própria definição da “magia do cinemaâ€. Assim como a vida, ela jamais pode ser totalmente desvendada, simplesmente porque nem sempre faz sentido.

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Tânia e Hélder: tipo Luan e Vanessa.

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