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À pólvora, com amor

09.12.05

por Rodrigo Campanella

Querida Wendy

(Dear Wendy – Dinamarca/França/Inglaterra, 2005)

Dir.: Thomas Vinterberg
Elenco: Jamie Bell, Bill Pullman, Novella Nelson

Princípio Ativo:
Ironia com gatilhos

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Dear Wendy leva toda a pinta de irmão caçula de Dogville, já que a paternidade é a mesma (Lars Von Trier é responsável pela escrita do filme) e o tema parece se repetir em grande escala. O que temos são dois grandes cenários (uma praça e a parte abandonada de uma mina) montados e filmados como se fossem palcos, uma crítica cheia de unhas afiadas contra o ‘sistema americano’ e uma porção de gente mantida num estado que lembra uma espécie de catatonia social, filmada como algo bem próximo de um retardamento.

Mas ao contrário de exibir a ‘crueldade com bons propósitos’ dos moradores de Dogville, Trier nos joga para o outro lado do palco. Estamos no meio de um típico filme adolescente de amadurecimento, que poderia ser bem Os Goonies, não fosse o rumo irônico e tão mais próximo de um nó na garganta que as coisas tomam aqui.

Imagine então: Dick é um adolescente em Estherslope. O único trabalho decente na cidade é trabalhar na mina, coisa que ele mais abomina na vida. Órfão de repente, descobre que a arma de brinquedo comprada na infância é, na verdade, uma arma real. Em pouco tempo, reúne os outros excluídos da cidade em torno de um clube que cultua armas. Com uma única condição: o clube é pacifista e prega que, de modo algum, sejam utilizadas as armas.

A sensação de poder experimentada por cada um dos integrantes do clube (“Os Dândisâ€) é algo bastante comparável ao que seria num ambiente mais moderninho a força de um cartão de crédito recheado no bolso. A facilidade do diretor Vinterberg em estabelecer uma situação ao mesmo tempo tão ‘estadunidense’ e tão universal é impressionante.

Com as armas bem guardadas e escondidas no coldre durante todo o dia, Os Dândis passam a se sentir cada vez mais seguros diante da cidade que antes os renegava – ainda que nem precisem exibir as armas. Em expansão, um circo doentio vai se exibindo – a facilidade em obter armas em qualquer canto, a veneração de uma sociedade pela violência sem necessariamente querer coloca-la em prática, o medo do forasteiro. No pequeno palco de Esterslope, Trier e Vinterberg dão suas ferroadas na América de cima, culminando com uma desconfortável cena em que descobrimos que nem mesmo a idéia do sexo existe por ali.

Nesse jogo de catatonias, o filme parece se mover como um relógio mergulhado em tequila, movendo-se num ritmo sem eixo certo mas com muita vontade. A ironia que cobre o filme antes do grande tiroteio é bem melhor que o realismo do final. O que vale a pena realmente é ver como ambas são capazes de deixar o público, mudo, afundado na cadeira, sem saber direito pelo quê foi atropelado.

“Olha a nuvem de fumaça†“E nem é o Planet Hemp!â€

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