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O Segredo de Tostines

04.03.06

por Rodrigo Campanella

Capote

(Capote – Canadá, EUA/2005)

Dir.: Bennett Miller
Elenco: Philip Seymour Hoffman, Catherine Keener, Perry Smith.

Princípio Ativo:
Philip Seymour Hoffman

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Capote, o biografado. (80ºC) Se você for se arriscar como roteirista para o cinemão americano, não esqueça: criar heróis e prometer redenção no final são peças-chave para uma carreira de sucesso. Mas cuidado: essa dobradinha que pode render uma boa coleção de Oscars na prateleira de seu produtor pode também cair mal num outro tipo de cardápio.

O Capote do título é Truman, jornalista de destaque por ter sido um dos criadores do “novo jornalismoâ€, gênero que levou a literatura para dentro das notícias. Ou vice-versa, já que o grande trunfo de Capote, segundo críticos, foi ter elevado o jornalismo ao status de literatura.

Mas essa é a menor dúvida em jogo. O Capote construído por direção e elenco é um homem em estado de contradição, verdadeiro ninho de cobras interiores. É sobre ele que se voltam todas as luzes, grande parte das vezes com sutilidade.

Não há dúvida de que o maior mérito nessa história é ter Phillp Seymour Hoffman no papel-título. Hoffman cria um Capote na corda-bamba entre ser honesto uma vez ou se render ao ego e à fama. Independente da escolha, deixa mais claro que a batalha já estava perdida: Capote é pintado como um caso extremo de desonestidade consigo mesmo.

A direção de atores é precisa e conduz com elegância o trabalho de Hoffman e de Catherine Keener como a escritora e amiga Harper Lee. Como em ‘Jonnhy & June’ (de quem deve roubar o Oscar de melhor ator), a história é reduzida a um recorte da biografia: nesse caso a escritura de “A Sangue Frioâ€, livro mais conhecido de Capote

A mesma sutileza que constrói uma bela e pequena cena onde Capote diz não sentir saudade da terra natal para logo depois se contradizer num gesto, faz falta no som e na narrativa. Os arranjos de cordas que surgem de repente desmontam o personagem pelo excesso de chorôrô. E a necessidade de redimir o jornalista ao final acaba quase o elevando a um mártir arrependido, omitindo até que Capote ainda publicaria artigos até sua morte.


Capote, um jornalista. (100ºC) Se Capote não for o melhor filme sobre as entranhas do jornalismo já feito até hoje, certamente é um dos três melhores. Hoffman, o roteiro e a direção - quando não fazem dele herói – constroem o retrato algo caricato mas cruel e sincero da relação entre quem tem a notícia e quem a vende. Mais do que isso, expõem o princípio da crise de excesso de intimidade que assola o jornalismo atual. E espalham pela tela a verdade indigesta de alguém que se vende às histórias dos outros para dar valor à sua própria. Quem é quem, fica por sua conta.

Sem piadinhas. Ele merece.

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