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Um filme B, de Brasileiro

25.12.06

por Rodrigo Campanella

O Céu de Suely

(O Céu de Suely (Brasil, França, Alemanha 2006))

Dir.: Karim Aïnouz
Elenco: Hermila Guedes, Georgina Castro, João Miguel, Maria Menezes

Princípio Ativo:
olho na lente, coração na mão

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Costoli,

Respondendo tua pergunta, quando alguém compendiar 2006 no cinema brasileiro, vai necessariamente passar por “O Ano em que Meus Pais Saíram de Férias†(esse copo até aqui de mágoa) e chegar n’“O Céu de Suelyâ€. Se ficar nesses dois terá sido justo. Mas é preciso lembrar “Ãrido Movieâ€, “A Concepçãoâ€, “Crime Delicadoâ€. Você me pergunta um filme, respondo cinco. Mas estou depois de duas caipirinhas, fim de ano, aqui na casa da família no interior, você há de me compreender.

Abraço, Campa

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É, cumpadre,

Difícil não perceber que esse “Céu†e aquele “Ano†são filmes profundamente de coração, de amor, no melhor sentido não-açucarado. Mas “O Céu†me remete a toda hora é à “Cidade de Deusâ€. Não para comparar, mas porque um e outro me parecem filmes-irmãos olhando nosso país (e nosso modo de encarar o mundo, nativos que somos daqui). Outro irmão caçula e emigrado para a capital seria “O Invasorâ€, ou “Cafunéâ€.

Mas veja lá: “CdD†era, em ritmo, prosa e luz estourada sobre a vala comum onde o Brasil desaba, entre o enfileirado de barracos e os Jardins paulistas. “O Céu de Suely†é sobre a travessia possível, o encontro, quando o Karim resolve fazer (mais) um filme de alma tão abertamente brasileira, sem julgamentos (“Madame†era assim). E o que me derrubou aqui foi a sensação de, pela quarta ou quinta vez em uma década, ter visto na tela, em ficção, o que sociologia talvez batize de “o Brasil profundoâ€.

Campa

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...Indo direto: a questão da travessia, da ponte que surge na tela é que continua me intrigando. Você ouviu aquelas músicas, você viu aquele lugar? Principalmente o carinho e o respeito com que ele enquadra aquele lugar na figura dela, e o inverso. Ela, voltando de São Paulo pra um lugar que é rapidamente (e sempre) menor e do tamanho do coração. E tentando alçar vôo pra um ancoradouro melhor...

Há um cinema inteiro, sutilmente, sem gritos, correndo ali no meio – coisa de quem cresceu, pensou e viveu muito na frente do projetor.

Anote aí: a próxima discussão nacional deve ser “o ideal do neo-realismo no cinema de Karimâ€. Pode ser bacana, se não for pra enquadrar mas para reconhecer os traços, bonitos, de neo-realismo vivos ali – a vontade de gritar, de transigir do nosso pós-guerra particular. Disso que deve vir a identificação com o martírio e céu de Hermila/Suely, como você lembrou Godard outro dia : é preciso mostrar a guerra, encará-la, antes de seguir. Com cara dura, barba mal-feita e o coração na mão: não é para isso que a gente se torna jornalista? Ou cineasta?

Abr´s, Campa.

Se o cenário for de papelão, nesse caso não é cenografia.

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