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Crimes e Pecados

08.05.08

por Mariana Souto

O sonho de Cassandra

(Cassandra’s dream, UK/EUA/França, 2007)

Dir.: Woody Allen
Elenco: Ewan Mcgregor, Colin Farrell, Hayley Atwell, Tom Wilkinson, John Benfield, Clare Higgins, Sally Hawkins, Philip Davis

Princípio Ativo:
culpa.

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Woody Allen pode ser considerado um diretor bastante versátil, ainda que essa versatilidade se dê dentro de algumas chaves específicas. Ele passeia na maior parte das vezes pela comédia – e em vários tons do gênero – embora, volta e meia, mergulhe fundo na tragédia. Mas mesmo quando o faz, dificilmente abre mão de alguns toques de humor e de características que tornam seus filmes facilmente reconhecíveis e autorais, apesar de tamanha pluralidade.

O novo “O Sonho de Cassandra†carrega em si um tom amargurado e desencantado com a vida, com o mundo e, sobretudo, com os homens. Allen faz um estudo da natureza humana, testando os limites da ambição, à medida que ela atropela princípios, amor, sentimento de família, lealdade e tudo o mais que vier pela frente. Depois de todos os atropelos, o que resta é só uma coisa: a culpa, capaz de levar à loucura e, por sua vez, a mais atropelos.

Um tratado da culpa com situações bem semelhantes foi feito em “Crimes e Pecadosâ€, outro dos dramas do diretor. Em “Cassandraâ€, porém, Allen segue um caminho diferente, revelando certo sentimento de punição e a aproximação de um desespero incontornável. Se lá a culpa desbotava com o tempo e era possível conviver com ela, aqui o remorso é insuportável. Comparações com o igualmente londrino “Match Point†também são possíveis, principalmente na abordagem do acaso.

Em “O Sonho de Cassandraâ€, a sorte, concentrada no personagem de Colin Farrell, desempenha papel importante e mostra como o ser humano está à mercê dos humores e reviravoltas do destino. O filme é construído num clima de sobriedade, ajudado pelas escuras locações inglesas, e por elementos como os constantes pesadelos e outros prenúncios da desgraça que se aproxima. O próprio título do filme remete a um personagem mitológico com dom premonitório. Em determinada cena, os irmãos Ian e Terry conversam com o tio Howard de forma nebulosa, através de insinuações perversas, momento este que se destaca pelo uso de uma câmera que ronda sorrateira e só consegue ver os personagens com nitidez quando o assunto é posto às claras, sem mais rodeios.

Ainda que com um ou outro movimento de câmera mais rebuscado, o trabalho de direção é quase invisível. O fundamental ali é o drama – roteiro, trama, personagens, relações. “O Sonho de Cassandra†não é uma de suas obras-primas, mas é um filme muito bem construído – e com uma visão de mundo marcada por uma boa dose de ironia, como quase tudo o que Woody Allen faz.

Mais pílulas:
- Sangue negro
- Um crime de mestre
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Mcgregor & Farrell: (quase) dois irmãos fazendo arte.

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