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Mãos à Obra, mas cheio de dedos

08.08.08

por Rodrigo Ortega

Transmissor - Sociedade do Crivo Mútuo

(Independente, 2008)

Top 3: "Primeiro de Agosto", "Ares e Pulmão", "Colorida".

Princípio Ativo:
Auto-crivo

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Há dois meses o site Senhor F escolheu os 50 discos independentes mais importantes dos últimos 10 anos no Brasil, sem citar nenhuma banda de Minas Gerais. Critérios subjetivos à parte, é verdade que depois de Rotomisic de Liquidificapum (1993), do Pato Fu, o indie mineiro não teve fôlego nem para subir a escada d´A Obra. A cultura de bandas cover e músicos virtuoses-malas não é a única culpada. As promessas indies locais sempre se prenderam a uma autoconsciência excessiva, medo de se expor. Mesmo que ninguém mais leve o Enciclopédia do Rock a sério, permanece o ranço do purismo e da exigência de um ideal de qualidade que não faz sentido na música pop.

Mas o rock de BH inicia uma época de renovação. O mérito é das próprias bandas, que lideram iniciativas como o festival Outrorock e o Combo Mineiro, coletivo formado pelos grupos Monno, Dead Lover´s Twisted Heart e Transmissor. Este último acaba de lançar o disco Sociedade do Crivo Mútuo, que foi disco da semana no Myspace e ficou disponível para download na íntegra (agora estão apenas seis faixas). O trabalho está no meio do caminho entre essa efervescência criativa, que gera pérolas como "Primeiro de Agosto" e o excesso de zelo pelo "lirismo" das letras e pela produção, que, em alguns momentos, gera um resultado insípido.

No Combo Mineiro, o Transmissor é o refrigerante - a parte mais doce e suave, complementada pela sustância do Monno-hambúrguer e a crocância dos Dead Lover´s-batatas-fritas. Eles são os segundos herdeiros do Diesel, banda pós-grunge que fez sucesso em BH antes de migrar para os EUA e voltar como Udora. A falta de sutileza e o excesso de afetação do Udora aparecem, felizmente, em proporções opostas no Transmissor.

Minha expectativa pelo disco era bem alta - culpa da faixa "Primeiro de Agosto", que já estava no Myspace desde o ano passado. A melodia simples e o vocal triste criam um clima cinza até chegar a luz-no-fim-do-túnel do refrão: "Primeiro de agosto, esqueci o desgosto / Novo motivo pra ficar / Outubro, Novembro, espero Dezembro". Essa aparentemente banal contagem de meses foi matéria-prima para uma música especial - essa merecia entrar já em uma lista de melhores independentes ou coisa do tipo.

Mas depois dessa faixa, que abre o disco, seguem semi-baladas com algumas letras que acabam caindo em um romantismo generalista e uma mistura de violões em acordes dissonantes e guitarras distorcidas. Elas agradam ao ouvido mas às vezes carecem de personalidade, especialmente quando assombradas pelo fantasma dos Los Hermanos. Os exemplos mais fortes são "Jenninha" e "Poema de batalha", com versos bem amarânticos, do tipo "Colho-me / varro-me / hummm".

"Ares e Pulmão", mais agitada, muda bem a dinâmica do álbum e "Colorida" é um bom encerramento, com um verso que, assim como os da faixa inicial, extrai melancolia e beleza da banalidade: "Seis semanas / Branco e preto / Tantos filmes pra entregar". Este final ajuda a deixar o saldo positivo. É bom ver que as bandas mineiras estão levando mãos à obra. Ou melhor, para além d´A Obra.

Transmissor gosta de brincar de claro e escuro

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