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O mariquinha e a multidão

My Chemical Romance ao vivo - Vivo Rio, 15/02/08

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por Braulio Lorentz

Fotos:

No primeiro show do My Chemical Romance (a melhor e menos manjada banda rotulada emo que já se teve notícia) no Brasil, ficou claro que os caras ainda estão se acostumando com o tranco que é encarar uma multidão como a de ontem. No show no Rio, que abriu a turnê do grupo na América do Sul, o vocalista Gerard Way mostrou ser daqueles que não sabe lá muito bem o que fazer com as mãos quando está falando ou cantando.

Ele coloca sua mão pálida na testa, em posição de "Ai meu Deus, morri", coloca a mão na cintura em posição de "Ai Jesus, não acredito" e sacode sua munheca meio como que regendo os pulos da platéia de jovens que lotou o Vivo Rio - e começou a montar filas na porta do local desde a madrugada desta sexta. Antes de meio dia, já estavam de prontidão mais de cem fãs dispostos a enfrentar sol e chuva para pegar lugares mais próximos ao quinteto de Nova Jérsei.

Gerard Way se movimenta muito pelo palco, mas tem altos e baixos em seu vocal. Não que ele não saiba disso. "Estou cantando como um mariquinha. Ou estou gritando alto o bastante?", perguntou, com aquele tom de brincadeira que tem uma certa paranóia por trás. Ao falar sobre o Rio, soltou mais uma frasesinha, errr, comprometedora: "Vocês têm um país muito lindo, quente e com... hm... homens de sunga". A afetação na música já estava de bom tamanho.

Sem voltar para bis (não que os fãs tivessem insistido muito) e sem tocar "The Ghost of you", o MCR cumpriu a difícil missão de desagradar alguns de seus admiradores menos fervorosos, graças a um show por vezes burocrático. Antes da apresentação, havia conversado com o guitarrista Ray Toro e ele confirmara que a turnê pela América do Sul não teria os mesmos aparatos da etapa norte-americana da Black Parade ("É um pouco por uma questão de custo", explicou). Por isso, nada de jogo de luzes mirabolantes para cada música, nada de uniforme de paquito, nada de tocar quase todas as músicas de seu terceiro e mais festejado disco. Pro nosso azar, a era Black Parade já está nas últimas, mas pelo menos pegamos as últimas batidas de seu coração; por mais que o site theblackparade.com indique o contrário (nele há uma imagem de um monitor cardíaco de um coração com sinais fracos).

Mesmo oscilando entre o morno e o quase quente, a banda ainda teve que parar de tocar logo no começo da apresentação, por causa de um tumulto e empurra-empurra de seus seguidores. Foi aí que entendi a força do refrão da boa "I'm Not Okay" (constituído basicamente de repetições do berro "I'm noooooot oookaaaaaaaaaaayyy"). Ao meu lado, uma franjuda fã do grupo se descabelava, caía em prantos, tentava balbuciar umas palavras acompanhando Way, mas sem muito fôlego. Ela realmente não estava okay.

"Teenagers" foi o momento mais feliz da banda, com direito a um Gerard Way cheio de trejeitos como se fosse um general. No power pop, até quem aparentemente não conhecia a música teve que se render. Os momentos mais empolgantes, porém, foram os esperados: "Helena" (no refrão era impossível ouvir o vocalista) e "Welcome to the Black Parade" (a parte como se fosse uma parada, anterior ao estouro punk da música, foi de arrepiar).

E se esse My Chemical Romance que desembarcou no Brasil e agora se apresenta em Curitiba (dia 17) e São Paulo (18 e 19) é o tal My Chemical Romance "mais cru e mais livre", definido por Ray Toro no já citado papo que tive com ele, melhor que algum produtor tenha a manha de cozinhar um pouco a banda. Ou de meter um desfibrilador no peito dos caras, para fazer alguns dos sinais vitais da Black Parade voltarem. Quanto mais teatral e menos punk rock adolescente fã de Green Day for a banda, mais eles se diferenciarão. Do rótulo emo é difícil de fugir, mas não da mesmice. Então: corra, Toro, corra.

Confira os vídeos do show:

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