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O quarto do filho

09.03.06

por Daniel Oliveira

As chaves de casa

(Le chiavi di casa, Itália/França/Alemanha, 2004)

Dir.: Gianni Amelio
Elenco: Kim Rossi Stuart, Andrea Rossi, Charlotte Rampling

Princípio Ativo:
Paternidade

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Ser mãe é padecer no paraíso. Só as mães são felizes. Mãe, só tem uma. Igual coração de mãe... Tudo bem, mães são fodas e tal, mas e pai? Segundo Nicole, personagem deste “As chaves de casaâ€, os pais sentem vergonha enquanto relegam às esposas o “trabalho sujoâ€.

Trabalho sujo, aqui, é cuidar de filhos especiais. Ou se você abomina o politicamente correto (como eu), crianças com deficiências físicas ou mentais. É o caso de Paolo (Andrea Rossi), um garoto com dificuldades para andar e que, apesar de estudar normalmente e ter um raciocínio rápido, pode apresentar atitudes bastante infantis em alguns momentos.

O filme do diretor e roteirista italiano Gianni Amelio narra o primeiro encontro dele, aos 15 anos, com o pai, Gianni (Kim Rossi Stuart), que o abandonou após a morte da mãe durante o parto. Eles vão juntos a Berlim para uma série de exames de rotina do garoto e são obrigados a improvisar uma relação, senão de pai e filho, ao menos de amizade.

Os enquadramentos de Amelio criam uma proximidade incômoda entre Paolo e Gianni – principalmente para este último. A inexperiência do personagem como pai é realçada pelos momentos em que tem que lidar com a deficiência do filho – as delicadas regras de simplesmente vestir uma camisa, por exemplo.

Um dos grandes trunfos do roteiro, porém, é a “consciência†encarnada de Gianni: Nicole, mãe de uma garota com deficiência mental, internada no mesmo hospital de Paolo. A atriz Charlotte Rampling é quase perfeita como uma espécie de “Morgan Freeman francêsâ€, com as falas sábias do filme guiando o desorientado protagonista. É de Nicole a teoria do primeiro parágrafo, ao afirmar que vê em Gianni o pai de Paolo porque ele parece com o marido dela: olhando para todos “com vergonha, como se o filho estivesse incomodandoâ€.

Além de Rampling, o cineasta conta com um bom elenco. Kim Rossi Stuart e Andrea Rossi (sem parentesco) forjam uma química espontânea, que torna quase impossível não se envolver com o nascimento da relação entre pai e filho. Por sua vez, o diretor não se deixa levar por excessos, sem grandes maneirismos técnicos ou arroubos melodramáticos. Sua câmera observa em silêncio, ousando perscrutar o drama dos personagens, ao mesmo tempo em que respeita a delicadeza do assunto.

“As chaves de casa†resulta da objetividade e do foco da equipe – não há astros hollywoodianos buscando a grande cena para concorrer ao Oscar. A sobriedade e a verdade sentidas durante seus 100 minutos, e a satisfação ao sair da sala, lembram que cinema é, no final das contas, uma boa história, bem contada.

Rossi e Rossi: proximidade incômoda

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