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CIA no divã

15.03.07

por Daniel Oliveira

O bom pastor

(The good shepherd, EUA, 2006)

Dir.: Robert De Niro
Elenco: Matt Damon, Angelina Jolie, John Turturro, William Hurt, Robert De Niro, Billy Crudup, Michael Gambon, Joe Pesci

Princípio Ativo:
luz, sombra e estrelas

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O teatro social
Elizabeth II não teve escolha: ela nasceu rainha e aquele é o teatro que ela interpretará pelo resto da vida. Já Edward Wilson (Matt Damon) optou – com a ajuda de uma gravidez indesejada, é verdade – por abolir sua vida pessoal para jogar war de gente grande. Inspirado no fundador da CIA James Jesus Angelton, o protagonista é a incorporação do serviço de Inteligência - seus sentimentos servem somente para interpretar informações úteis ao trabalho.

O trabalho de Wilson, iniciado na 2ª Guerra e intensificado na Guerra Fria, é a vida que ele nunca assumiu em casa – na volta, após anos na Europa, não saber qual dos garotos brincando na rua é seu filho basta para mostrar isso. O trunfo de “O bom pastor†é fazer da ascensão da trama política um contraponto proporcional ao naufrágio pessoal do personagem e sua família de fachada com Margaret (Jolie) – uma mulher exuberante no início, que é castrada pelo próprio amor.

O teatro político
Wilson mergulha no mundo da contra-inteligência, em que os objetos ficam na luz enquanto os sujeitos vivem permanentemente na sombra. O mesmo contraste que corta o rosto do personagem, que perde amigos – e ganha colegas, em que ele aprende nunca confiar. É um caminho longo e escuro retratado pela bela fotografia de Robert Richardson (O Aviador, Kill Bill) na cena em que Wilson descobre as conseqüências de não levar seu trabalho a sério.

Damon é perfeito como um homem racional e auto-centrado - cujo silêncio é ensurdecedor, nas palavras de seu arqui-inimigo. O Mãe (como Wilson é conhecido pelos adversários) entende logo que deve interpretar as emoções dos outros e filtrar as suas – até o óculos grande parece um escudo para o personagem.

O teatro cinematográfico
É bom ser Robert De Niro e ter amigos para formar um elenco tão estrelado – e tão adequado em seus papéis. E só ele para dirigi-los com mão firme e fazendo os longos diálogos fluírem tão bem. O touro indomável ainda monta seu filme com preciosismo, amarrando flashbacks e presente de um jeito que muita gente tenta, mas não consegue – a transição do som do avião na gravação para os aviões bombardeando Londres é uma pérola que faz brilhar os olhos.

“O bom pastor†tem falhas: sofre do “mal dos vários finais†e a metragem podia ser menor. O personagem de Alec Baldwin, por exemplo, poderia ser facilmente eliminado. Mas depois de duas horas, quando o longa é fechado com o escritório novo da CIA, todo branco, em que não existe mais a definição de luz e sombra – de bem e mal – você abaixa a cabeça. Em reconhecimento a alguém que sabe o que está fazendo.

Damon, momentos antes de ser praticamente estuprado por Jolie. Alguém aí não queria estar no lugar dele?

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