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Fernando acabou de entrar

por Daniel Oliveira

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Fernando Meirelles é interneteiro. Fato. Os blogs de seus filmes são reconhecidos pelos cinéfilos como aulas de cinema melhor que as encontradas em qualquer faculdade do país. E sua sinceridade torna seus textos mais interessantes que qualquer uma das trocentas colunas de fofoca que povoam a rede.

E é por isso que a forma mais fácil (e, de fato, quase única) de conversar com o diretor é ser tão frenético no teclado quanto ele. O Pílula Pop mandou as perguntas abaixo enquanto "Ensaio sobre a cegueira" era exibido no Festival de Toronto de onde, acreditamos, Meirelles nos respondeu. De forma bem rápida e objetiva, assim como a edição de seus filmes. Quem sabe, da próxima, a gente consiga encontrá-lo para um cybercafé.

Ok, péssima piadinha.


Clássica foto 'o artista e sua musa'.

Pílula Pop: Quando você leu o livro do Saramago pela primeira vez e qual foi sua reação? Na época, você pensou, mesmo que remota e hipoteticamente, em dirigir uma versão cinematográfica dele?

Fernando Meirelles: Li o livro, me impressionei e pensei em adaptá-lo, mas nem sabia como faria isso. Como o Saramago não me vendeu os direitos (era 97), parti para outros projetos. Em 2006, por coincidência, fui convidado a dirigir o filme por um produtor canadense. Talvez pela magia deste acaso, acabei topando ainda sem saber como seria o longa. Mas filmes são assim mesmo, a gente vai descobrindo como fazê-los ao fazê-los. É como um Boeing que se constrói em pleno vôo. Me interessou a idéia de quão próximo estamos de animais primitivos, apesar de tanta universidade, civilização e chás com torradas.

Pílula Pop: Como você mesmo deixou claro no blog do filme e nas entrevistas que concedeu, "Ensaio sobre a cegueira" passou por vários cortes e versões. O que, no resultado final, é fiel ao roteiro de Don McKellar e o que ficou diferente?

Fernando Meirelles: Apesar das várias mexidas, acho que o filme ainda ficou muito fiel ao roteiro do Don. Na verdade, a cada nova montagem eu mandava para ele. Foi um trabalho de equipe, como é sempre no cinema. As mudanças foram sempre de ajustes de tom. Mais forte aqui, menos ali. Aumentar uma cena, deixar outras mais rápidas. Mas elas nunca afetaram a história de fato.

Pílula Pop: Qual foi a parte mais difícil das filmagens?

Fernando Meirelles: Para mim, a parte mais difícil, na verdade, sempre é saber se tenho um roteiro bom, pois ali há um monte de questões subjetivas envolvidas. Os problemas de produção são mais objetivos, basta planejar para resolvê-los: decidir quantas pessoas precisamos para sujar e limpar ruas em duas horas, quais órgãos da prefeitura temos que contatar para fechar a cidade etc. É quase trabalho de engenharia. Menos angustiante.

Pílula Pop: Qual a sua cena/seqüência preferida no filme?

Fernando Meirelles: O momento em que Danny Glover levanta o rádio e toca uma música do Luiz Bonfá. Todos os personagens por alguns instantes saem daquele horror. A arte pode de fato elevar e humanizar os homens.

Pílula Pop: A história de "Ensaio sobre a cegueira" é, quase desnecessário dizer, muito forte e mexe com algo muito delicado, que é nossa crença na humanidade e na bondade que é (ou não) inerente a ela. Você ficou afetado pela filmagem de alguma(s) cena(s) ou seqüência(s) em particular - ou mesmo na edição?

Fernando Meirelles: A maluquice desta história é que a equipe e o elenco se deram tão bem durante o processo que dávamos risada e nos divertíamos muito o tempo todo. Fomos para o set preparados para sofrer e, de repente, foi só alegria. Bichos estranhos nós somos.


Meirelles, feliz da vida com as críticas do filme.

Pílula Pop: Você escreveu no blog de filmagem que 'usar um close da Julianne' era uma solução constante para dificuldades/dúvidas na edição. Mas no filme, não existem tantos assim e as reações dela só são usadas em momentos chave da história. Aliás, o "Ensaio..." quase não tem closes...isso é proposital?

Fernando Meirelles: Caramba, achei que tinha bastante. Acho que nossas medidas são diferentes. Vê só, cada um vê o que quer. Acho que vemos com a cabeça e não com os olhos.

Pílula Pop: Além das reações da Mulher do Médico, o elemento que mais compartilha, e extravasa, a 'compaixão' do público diante do que se passa na tela é a bela trilha do Uakti. Até onde você 'briefou' o Marco Antônio Guimarães e onde começa a leitura dele do filme?

Fernando Meirelles: Fiz uma reunião com o Marco Antonio em BH, antes de começarmos o trabalho, e achei que faria outras, mas ele se adiantou e fez toda a trilha depois desse nosso papo. Tomei um susto. Com a música pronta, nos reunimos por três dias em BH novamente para cortá-la e adequá-la às cenas.

Pílula Pop: O vídeo da reação/cumprimento do Saramago à exibição do filme em Lisboa virou um sucesso no Youtube. Após a aprovação dele, você está satisfeito com o resultado do trabalho ou ainda espera o retorno do público para saber que 'acertou a mão'?

Fernando Meirelles: A boa reação dele e da imprensa (brasileira e internacional) que estamos tendo me deixam confiante de que o filme tem alguma coisa. Mas nunca vai ser uma unanimidade, claro.

Pílula Pop: Podemos esperar por muitas cenas/seqüências cortadas no DVD?

Fernando Meirelles: Ainda não pensamos no DVD, mas acho que vou incluir pedaços cortados sim. Quero também ter um botão para que o espectador assista ao filme com ou sem as narrações do Danny Glover que tirei. Gosto delas.

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