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A quem a letra não urge? Considerando essa necessidade da escrita inerente a muitos, cá estão algumas letras que buscam cores como tratamento para dores diversas. |
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Ela não é
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Eu fecho a porta de casa delicadamente com medo de que me ouçam e acordem quando eu chego. Tenho acordado cada dia com mais medos.
Medo de cachorro, do escuro, de engordar, de doer, de doença, do futuro. Dizem que o normal é que as pessoas adultas não sintam tanto medo como eu. Eu sinto. Eu sou adulta. É o que dizem quando se tem marido e filhos. Mas ainda tenho hora para voltar. Dez e quarenta e sete é o limite. Dez para as onze é muito, é quase tarde.
Dos filhos, Ricardo, o mais novo, tem onze anos e o mais velho, 21. Dez anos. Tenho medo do que a diferença possa causar. E tenho medo da guerra, de dormir e acordar sem meus braços, principalmente nos dias em que pego hora-extra e não chego em casa a tempo.
Meu marido é alto, bonito e forte. Ele não tem dó da carne, um verdadeiro carnÃvoro. Me ensinaram a comer carne, a amá-lo, amar meus filhos e a mim mesma. Essa regra sempre está lá, brilhando nos olhos de meu marido. E quando como carne meu corpo dói, fico inchada. Acho que não conseguirei nunca digerir a carne.
Meu marido é forte e bem mais velho do que eu. Ele é velho e bem mais forte que eu. Acho que um dia vai me matar. Tenho medo de dormir e acordar sem pernas.
Meus filhos não têm idade nem força, mas são lindos. Puxaram o pai. Não têm medo porque são homens. “Homem que é homem não sente medoâ€, ele diz. Eu sinto medo por eles, por mim e porque são homens.
Ele diz que eu sou fraca.
-- Camilla Felicori gosta muito de cores. camilla.felicori@gmail.com
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