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Amimurga Letra
Camilla Felicori
A quem a letra não urge? Considerando essa necessidade da escrita inerente a muitos, cá estão algumas letras que buscam cores como tratamento para dores diversas.

Papai Noel

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Ele se chamava Vinícius. Cabelos loiros e encaracolados, seu apelido era carneirinho. Apelido do qual ele não gostava nem um pouco, mas não dizia. E como não o fazia, todos continuavam chamando-o assim.

Carneirinho gostava de olhar as estrelas à noite. Quando era pequeno, descobriu uma estrela vermelha. Limpou os olhos com as mãos sujas de ar puro e olhou novamente, sim, era vermelha. Lembrou-se da história contada por sua mãe do Papai Noel, um ser muito bondoso que gostava de presentear crianças e vinha toda noite de Natal voando em seu trenó. A mãe esqueceu-se de contar para Vinícius do Pólo Norte, e Carneirinho nunca parou para pensar sobre as roupas de frio que o velhinho usava naquela época tão quente. A questão é que Vinícius não sabia onde o velhinho morava. E quando viu a estrela, vermelha, logo concluiu, {Ali! Achei! É ali que mora o Papai Noel!!}. E essa foi uma grande descoberta, muito importante para a vida de Carneirinho. Ele não sabia se acreditava em Deus, mas de uma coisa ele tinha certeza, o velhinho bondoso estava lá, na estrela vermelha, sempre. Todos os dias o céu tinha estrelas e isso deixava Vinícius mais feliz, porque se sentia menos só. Achava que sempre que olhasse para cima e visse a estrela vermelha o velhinho sorriria para ele. E isso bastava.

Um dia ele cresceu um pouco e lhe contaram que existia um instrumento que lhe permitia ver as estrelas mais de perto. Seu coração disparou com rapidez e transbordou de felicidade, sim, agora ele poderia enxergar o sorriso do seu velho amigo, veria algo além da cor vermelha.

A luneta seria seu meio de aproximação com aquilo que lhe era até então desconhecido, o sorriso do velho existia apenas em sua mente.

No entanto, por mais que buscasse se aproximar e ver mais perto a estrela vermelha, sentia que o sorriso sempre lhe escapava, como se estivesse em uma distância tão grande que ele nunca poderia alcançar.

Um dia, percebeu, enquanto andava de carro, que a estrela continuava no mesmo lugar. Perguntou a seu pai, ele lhe mostrou o mapa da América do Sul ao chegar em casa. Mostrou um ponto mínimo e disse {É aqui que moramos, filho. Observe o tamanho do mapa. Nesse pontinho há mais de mil pessoas, muito mais que mil pessoas. Veja como é grande o mapa. É como se quando andamos de carro não nos movêssemos, por isso a estrela parece estar no mesmo lugar. Na verdade quem se desloca pouco somos nós.}.

Ele olhou para o mapa, encostou o dedo no ponto. A ponta do seu dedo era maior que o ponto. Ficou triste demais com tal descoberta, descobriu sua mísera condição no mundo, ele, tão menino, e colocou em questão se seu amigo vermelho saberia mesmo quem ele era, tantos anos olhando para a estrela e talvez o velhinho nem pensaria em outra coisa que não um animal com lã ao ouvir a palavra Carneirinho.

Olhou para o céu outro dia, ainda estava lá a estrela vermelha. Estava estudando uma matéria nova na matemática, os números negativos. Era infinito nos dois lados, nunca havia fim para os números e ele era apenas um. Se cada pessoa no mundo fosse um número, ele seria um número apenas, ou uma combinação de números que representaria a unidade de sua pessoa. Talvez fosse muita pretensão pensar que o velho amigo fosse mesmo seu amigo, pensou. Ele era menor que um ponto, chorou.

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Camilla Felicori gosta muito de cores.
camilla.felicori@gmail.com

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