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Mostra Kléber Mendonça Filho em Ipatinga

Cinema molhado

por Marcelo Morato

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A chuva fina que começou a cair, uma hora antes do evento, já afastava os prognósticos de casa cheia. Não que fosse um evento ruim: a exibição de três curtas do cineasta pernambucano Kléber Mendonça Filho seria, sem dúvida, uma agradável aula de cinema e fazia parte da programação do Curta Minas.

O local também era apropriado. O auditório bem-equipado de um centro universitário em que eventos bons e gratuitos costumam fazer sucesso. A divulgação, apesar de acanhada, haveria de arrebanhar alguns cinéfilos.

A chegada ao auditório, dez minutos antes do horário marcado, causou espanto. Lá dentro, apenas quatro pessoas conversavam. A única menina do grupo reclamava: “poxa, esses eventos precisam ser mais divulgados. Nós, por exemplo, estamos aqui por acaso. Confundimos o horário de uma aula e vimos o cartazâ€.

Passado o baque inicial, não foi difícil descobrir quem era quem na rodinha. Dois dos três rapazes que lá estavam eram estudantes de jornalismo e estavam responsáveis pela sessão do dia. Os outros dois formavam um casal de calouros de Engenharia Mecânica. E, ainda que estivessem lá por acaso, eles formariam todo o quórum do início da exibição.

Apagadas as luzes, o silêncio dos momentos tensos de “Menina do Algodão†nos deixava com uma certeza: a chuva lá fora estava mais densa e, com isso, a chance de reverter o diminuto número de espectadores era quase nula. Ainda assim, o público cresceu 50% no primeiro intervalo. Um estudante de publicidade adentrou, esbaforido, como se ele mesmo tivesse acabado de ver a tal menina que aterroriza os banheiros públicos.

Já durante a exibição de “Vinil Verdeâ€, chegam mais dois espectadores. Um deles, ensopado de chuva, senta-se ao lado do que havia chegado minutos antes. Como consolo, eles assistem a “Eletrodomésticaâ€, o mais longo e mais bem produzido filme de Kléber Mendonça Filho.

Fim de sessão, luzes acesas. O casal de calouros havia sorrateiramente deixado o local, sem que ninguém desse falta. O rapaz ensopado culpa a chuva por seu atraso e sugere subliminarmente a re-exibição do que ele havia perdido. O pedido foi, obviamente, ignorado e um dos organizadores tentou, em vão, seguir o protocolo do evento e começar uma discussão: “reparem que o diretor dá dicas sobre o ano em que o filme se passa. Na sinopse, ele diz apenas ‘década de 90’, mas há uma cena em que o locutor da TV fala em URV. A história, dessa forma, se passa em 1994â€.

Três cabeças balançam timidamente, concordando sem muita euforia com a afirmação do frustrado palestrante. A discussão havia morrido por ali. “É duro chamar público nessa época de provas finais, né?â€, arriscou um dos rapazes “sobreviventesâ€. Os organizadores concordaram. “Já tivemos públicos bem melhores. Mas na semana passada já foi fracoâ€.

Na saída, ainda abordei a menina que entrara atrasada, permanecera muda e saía calada. “Sou estudante de jornalismo e amiga de um dos organizadores. Vim vê-loâ€. Agora sim, estava tudo devidamente explicado.

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