“Quando eu saà de Nova York, o filme mais excitante na cidade era espanhol, do Pedro Almodóvarâ€. À parte o provável ressentimento de Woody Allen pela América, que aparentemente não quer mais bancá-lo, se buscarmos as duas últimas décadas do cinema da Espanha entenderemos o que ele diz.
O cinema espanhol contemporâneo tem nomes e números. A matemática não impressiona muito: apenas 10 a 20% da receita vêm de filmes domésticos. Ou talvez impressione: 50% dessa bilheteria é gerada por algo em torno de cinco tÃtulos; em 2004, oito a dez filmes responderam por 80% do total.
Crime Ferpeito: porque o cinema espanhol tem cor própria. E forte.
O diferencial é fazer cinema com personalidade – o que falta ao Brasil. Não fosse isso, a qualidade do produto espanhol não se destacaria a ponto de fazer sombra a Hollywood. A geração de Almodóvar e Bigas Luna, pós-1970, é responsável por uma renovação, apontada por crÃticos e cinéfilos, que abriu espaço para o sangue novo dos anos 90.
Sem medo de inovar, os mais jovens não perdem o vÃnculo com a tradição. Cada um expressa o que tem a dizer à sua maneira e há questões comuns entre eles. Não se envergonhe de não conhecer um único nome. Os compatriotas menos famosos de Almodóvar, que já ocupa os maiores cinemas, são confinados por aqui no circuito de arte.
O motivo disso gasta tão poucos caracteres que chega a desiludir: falta de interesse dos grandes exibidores. O crÃtico Inácio Araújo, da Folha de S. Paulo, comentava esse ano na Mostra de Tiradentes: “Com o fechamento das salas de rua, os cinemas vão para os multiplex de shopping. E o ideal é você ver vários tipos do mesmo filme. Se o cara vai e esgotou ‘007’, tem que ter um análogoâ€. Afinal, cinema é um negócio. Os Estados Unidos dominam 90% do mercado mundial, à exceção da França, Nigéria e alguns paÃses asiáticos. E os multiplex compram o tipo de produto que seu público consome normalmente.
Julio Medem, posando de galã para a divulgação.
Por isso, o cinéfilo que quiser aproveitar esse cinema deve desviar o olhar das enormes chamadas publicitárias sobre a estréia de Piratas do Caribe, ficar atento àquela pequena matéria sobre o novo filme de Fernando León de Aranoa e agradecer pela Sala Unibanco mais próxima.