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O gato e o rato

12.03.10

por Daniel Oliveira

Ilha do medo

(Shutter Island, EUA, 2009)

Dir.: Martin Scorsese
Elenco: Leonardo DiCaprio, Ben Kingsley, Mark Ruffalo, Michelle Williams, Max Von Sydow, Emily Mortimer, Patricia Clarkson, Jackie Earle Haley

Princípio Ativo:
noir, expressionismo e Scorsese

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Um detetive parte em uma investigação perigosa, violenta e cheia de reviravoltas, ao mesmo tempo em que é assombrado por seus fantasmas e demônios interiores.

Isso é cinema. Chama-se filme noir.

Uma realidade invadida por sonhos e traumas, distorcendo a linha que separa essas dimensões e assemelhando a vida a um pesadelo.

Isso é cinema. Chama-se expressionismo alemão.

Um homem em luta contra a violência que carrega dentro de si mesmo e que ele não quer deixar determinar sua existência.

Isso é cinema. Chama-se Martin Scorsese.

Que o diretor nova-iorquino se utilize de todas essas referências em “Ilha do medo†não é mero sintoma de sua cinefilia. É uma coerência com a história do livro de Dennis Lehane, que se apropria de uma fórmula (a ficção pulp-noir) para falar de coisas bem maiores.

Do momento em que o protagonista Teddy Daniels (DiCaprio) e seu parceiro Chuck Aule (Ruffalo) adentram o manicômio prisional da Ilha Shutter - cercados por guardas de expressão suspeita, uma trilha musical de arrepiar os pelos da unha e uma edição que parece buscar o que há de errado com o lugar – o cineasta joga o espectador naquele universo e se dispõe a traduzir cinematograficamente cada página do livro de Lehane, adaptado quase ao pé da letra por Laeta Kalogridis. Os dois detetives chegam ali para investigar o desaparecimento de uma prisioneira, Rachel Solando, enquanto o médico responsável, Dr. Cawley (Kingsley), observa cada passo que eles dão.

O filme funciona como um suspense, um thriller para entretenimento, mas diz muito mais nas entrelinhas. “Ilha do medo†trata de paranoia. Imaginário. De construção e elaboração de histórias e de como nos servimos disso.

Scorsese traduz isso em imagens com a competência e exuberância visual habituais. A fotografia de Robert Richardson (parceiro usual de Scorsese e Tarantino em seus últimos trabalhos) sublinha o desenvolvimento da história. Ela começa com cores e locações quase impressionistas, delineando a impressão que o local causa nos detetives, e vai se tornando mais quente, gótica, colorida e claustrofóbica – expressionista, nos ângulos sufocantes e na dramaticidade da tempestade - à medida que o labirinto se desenrola em torno do protagonista.

A edição de Thelma Schoonmaker complementa a sensação de pesadelo, abusando dos flashes que criam no público a mesma desorientação que vai tomando conta de Teddy. E quem vai descascando as camadas do protagonista é a ótima atuação de DiCaprio. Do detetive noir durão ao prisioneiro de uma armadilha insana, ele chega no personagem mais próximo do “Touro indomável†Jake La Motta na filmografia recente de Scorsese.

E é aí que fica claro o interesse do diretor por um filme tão “inusitado†em sua filmografia: “Ilha do medo†é um protagonista complexo em crise consigo mesmo + paranoia + metalinguagem. E isso é Scorsese.

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DiCaprio&Daddy go noir.

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