Godzilla (2014) | |
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Direção: Gareth Edwards Elenco: Aaron Taylor-Johnson, CJ Adams, Ken Watanabe, Bryan Cranston |
“Godzilla” é sobre encontrar o equilíbrio. Balancear as forças e sentimentos de forma a surgir um meio termo efetivo. Ironicamente equilíbrio é aquilo que falta à narrativa do filme. Mais uma refilmagem (ou quase-contunuação do clássico japonês de 1954), a história não se decide em relação ao protagonista: arcos dramáticos variados andam em paralelo e se cruzam, mas nunca se completam. O objetivo parece ser o de deixar o protagonismo para o monstro-título, mas as coisas não funcionam como deviam.
Por um lado os personagens humanos e suas tramas incompletas funcionam bem para ilustrar nossa pequenez frente aos seres vistos na tela. É como se o diretor Gareth Edwards (do excelente “Monstros”) quisesse nos dizer que aquelas pessoas não importam, são como formigas para Godzilla e cia. O problema é que todos os closes, música emocionante e cachorro correndo gritam que sim, esses personagens são importantes e devemos nos preocupar com eles. Daí vem o desequilíbrio de uma obra que quer ao mesmo tempo que simpatizemos com seus heróis humanos e vibremos com o monstro que representa um perigo para esses mesmos heróis.
O clima de desesperança total poderia até funcionar se o roteiro não insistisse em esconder o Godzilla, fazendo um mistério inútil a seu respeito. Por isso o meio do filme é certamente o mais problemático visto na tela, já que sua indefinição deixa tudo muito cansativo: nem vemos o mostro nem ligamos pros humanos. A tentativa de desenvolvimento dos personagens e do suspense fica com cara de enrolação, já que pouco importa o que está acontecendo ali, uma vez que não possuímos ligação emocional com Aaron Taylor-Johnson e nem com o Godzilla. Ele é o militar que quer voltar para casa e, em uma nada sutil referência à “Odisséia”, enfrenta os mais diversos percalços na tentativa de reencontrar a esposa após um incidente em uma base que se revela um verdadeiro cavalo de Tróia. Mas não há conexão emocional com o espectador como acontece com o seu pai (Bryan Cranston) no início do filme, um personagem bem construído que poderia ser melhor aproveitado.
A primeira parte funciona muito bem em sua dimensão humana, enquanto a última parte é espetacular em sua dimensão monstro. Se no início nos emocionamos com Cranston, ao final nos emocionamos com o Godzilla. É quando o rei dos monstros faz valer seu título e assume de vez o protagonismo da trama. Pena que até lá tenhamos que enfrentar uma boa hora de dramas mal construídos intercalados com sequências eletrizantes como a da ponte no escuro.
“Godzilla” não deve ser visto em seu 3D inútil e escuro, mas merece a tela grande do cinema e o melhor sistema de som disponível. É um filme com problemas, mas que vale como reverência a um dos maiores ícones que a sétima arte já criou. Apesar de esconder demais sua estrela, Edwards finalmente encontra o equilíbrio ao final, o mesmo equilíbrio que pai e filho, marido e esposa, cientista e militar buscam durante toda a projeção. Se nos anos 50 o monstro era uma metáfora para a era nuclear, o Godzilla atual é a representação de uma pós-modernidade de laços efêmeros e incompletos. Uma força da natureza capaz de trazer de volta o equilíbrio para um mundo desequilibrado. O filme representa bem o momento de crise atual nas instituições, sejam elas familiares, científicas, políticas ou militares. E como às vezes é preciso destruir para recriar. Neste sentido, “Godzilla” é até revolucionário. Apesar de extremamente desequilibrado.