Lugar de mulher é no mundo


Uma doença desconhecida se espalha por todo o mundo (calma, continua lendo, pois não tô falando do Covid). Essa doença atinge apenas os homens. Geração após geração, eles vão desaparecendo. Apenas mulheres começaram a nascer. Os cientistas acham que todos os estudos sobre essa condição são bobagens até que, gradativamente, os homens passam a não existir mais.

O mundo muda. Tudo que entendemos hoje como mundo se modifica. Só as mulheres passam a existir e construir um mundo melhor. A canadense Aminder Dhaliwal apresenta em Mundo Mulher, publicado pela Editora Conrad, um mundo muito melhor. E eu concordo com ela.

Salto alto e Coxas de Beyoncé

Diferente do peso dramático que o tema pode conter, onde temos a extinção de todas as pessoas que nasceram o gene Y, Mundo Mulher mostra o oposto. Apresenta a leveza e a cooperação em um mundo que não acabou, simplesmente seguiu. E seguiu muito bem numa crescente de evolução.

Escrito em formato de várias tiras, Mundo Mulher é quase uma antologia que segue, de maneira alternada, as histórias de várias personagens. Mulheres idosas que lembram da época que os homens existiam, mulheres que se organizam politicamente, mulheres que buscam amor, mulheres que trabalham, mulheres que ainda são crianças e já nasceram no novo mundo, mulheres que se sentem sozinhas, mulheres que vivem em grupo. Isso tudo em um vilarejo chamado Coxas de Beyoncé.

Bom, já conseguimos entender que Mulher Mundo é cheio de bom-humor. E realmente é! Pois, Aminder deixa claro que a sua visão não é panfletária, mas busca expor seu ideal feminista de maneira cômica.

Mas ela provoca. Faz isso quando coloca em pauta questões simples como: por que mulheres precisam usar salto alto? Algo, provavelmente imposto em uma sociedade estruturalmente machista e que no mundo dela é desnecessário.

Agora pensa comigo. Na real: por que mulher precisa usar salto alto? Eu duvido que possa sair uma resposta profunda e necessária sobre este questionamento.

Mundo Melhor

Mulheres não são feitas por salto alto e nem de nenhum outro símbolo imposto sobre o prisma do patriarcado. Por isso, Mundo Mulher coloca esses estigmas em situações simples, para responder questionamentos de forma igualmente simples.

E se você for homem, se prepare para se sentir desconfortável. Pois Aminder apresenta várias questões que podem te fazer pensar no impulso: “Pera, não é assim!”. Mas, a questão, amigo, é que é sim.

A história não é feita para você. Mas, tantas outras histórias não foram feitas para mulheres e elas tiveram que ler, então, acostume-se.

O trabalho de Mundo Mulher é mostrar o quanto os padrões impostos são completamente desnecessários, com uma leitura leve, sem perder o teor de entretenimento.

E a leveza é morada de todas as situações vividas pelas personagens. Elas namoram, tem questões corriqueiras em relacionamentos, aprendem, ensinam, sofrem, têm ansiedade, curiosidade, saudade.

Até que percebemos que a não existência dos homens não muda o comportamento humano. Pois, tudo que os homens sentem, as mulheres também sentem. Porém, sem os homens, não existe a cobrança, não existe o assédio, não existe a diminuição das ações ou ideias das pessoas só porque são mulheres.

O mundo “pós-apocalíptico” de Aminder, não é o final dos tempos. E sim, quase um recomeço muito melhor e mais livre.

Não serei interrompida

Aminder faz um trabalho necessário para as mulheres, mas algumas coisinhas dentro dos diálogos criados por ela poderiam ser mais inclusivas, principalmente nas questões relacionadas às pessoas trans. Já que o vírus matou todos aqueles que nasceram homens, como ficaram as pessoas trans que era mulheres e se tornaram homens?

Gostaria de ver como esses homens estariam dentro de um mundo de mulheres.

Questão à parte, a sagacidade que Aminder usa para expor suas provocações é tanto pertinente para fortalecer os ideais feministas, mas também para educar os homens (claro, aqueles que estão abertos para tal). que chega a ser educativa, quase como se Mundo Mulher mostrasse que as mulheres teriam que reaprender tudo no mundo, já que os homens não existem mais. Porém, isso não transparece ingenuidade e muito menos burrice.

Bom, e se você é homem e questionou minha afirmação acima com um pensamento parecido com “Se elas tiveram que aprender do zero, é porque os homens realmente são essenciais para o progresso da humanidade”, eu me despeço com as aspas da própria Aminder: “seria tipo as mulheres tendo que aprender a falar de novo porque não estão sendo interrompidas.”

Boa leitura!

Tico Pedrosa é roteirista, escritor e fã de quadrinho desde sempre. Você pode conferir as ideias dele no instagram e twitter.

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