4 X 2046
07.01.06
por Gabriel Banaggia
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2046
(2046, China/França/Alemanha/Hong Kong, 2004)
Dir.: Wong Kar-wai
Elenco: Tony Leung, Gong Li, Faye Wong, Zhang Ziyi, Chang Chen, Maggie Cheung
Princípio Ativo: Relaxante emocional
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2046 é o último ano de tolerância que China e Inglaterra concedem a Hong Kong para se adaptar ao regime polÃtico continental.
2046 é o número do quarto de hotel no qual duas pessoas traÃdas pelos respectivos cônjuges se encontram e convivem.
2046 é o nome da história de ficção cientÃfica que fala sobre um tempo no qual nada muda e as memórias podem ser recapturadas e revividas eternamente.
“2046†é o filme que fecha a trilogia de Wong Kar-wai começada treze anos antes com “Days of Being Wild†e “Amor à flor da peleâ€.
“2046â€, o filme, tem como um de seus temas principais o tempo. Tony Leung vive novamente Mo Wan Chow, um escritor que saboreia diversos romances fugidios com belas mulheres. A forma como o diretor trabalha cada um dos casos é bastante distinta, com tomadas de duração variável conforme cada situação. A precisão de seu enquadramento, e a repetição de planos similares com suaves diferenças, já suas marcas registradas, permanecem ao longo de toda pelÃcula. O próprio ritmo do filme foge ao convencional, o que torna impossÃvel definir a centralidade de qualquer das historietas. Destaque, entretanto, para as atuações de Zhang Ziyi (de “O clã das adagas voadorasâ€), num de seus papéis mais sensÃveis até então, e Gong Li (de “Lua tentadoraâ€).
2046, a história de ficção cientÃfica, é escrita pelo personagem de Leung no decorrer do filme, e trata de um ano-lugar no qual é possÃvel reencontrar memórias perdidas e experimentá-las novamente. O trem que parte periodicamente para 2046, viajando simultaneamente no tempo e no espaço, numa velocidade que, ainda que estonteante, transmite a forte impressão de imobilidade em função de sua estabilidade, é a imagem perfeita para as reflexões do autor/diretor. Afinal, 2046 nunca aparece de fato, senão como distância. Ninguém pode confirmar a existência de 2046 porque ninguém nunca voltou de lá.
2046, o quarto de hotel, é simbólico no que lembra o mesmo tipo de espaço-tempo onde se encontravam Mo Wan Chow e Su Li-zhen Chan (Maggie Cheung, de “Heroâ€) de acordo com a história que antecede os acontecimentos de “2046â€, o filme. Chow a toda hora lembra que teve em suas mãos a mulher de sua vida mas a deixou escapar; ainda assim, seu tom é menos de lamento do que de conformidade, já que sabe que de nada adianta a pessoa certa no momento errado, seja ele no passado ou no futuro. A belÃssima cena em sépia que dura poucos segundos, nos quais Chow lembra seu amor perdido, comove.
2046, por fim, é o ano marcado para uma transformação profunda da sociedade de Hong Kong como um todo. Assistir ao filme pensando na história de vida do próprio diretor, nascido em Xangai mas criado em Hong Kong, pode conferir novos sentidos por exemplo ao plano final da pelÃcula, que mostra uma grande e indistinta cidade, talvez futurÃstica, junto a um grande anúncio. O que em princÃpio figura como mero merchandising pode então ser visto como sÃmbolo de todo um sistema e da divisão eternamente presente entre China e Hong Kong. Ignorar a dimensão polÃtica subjacente ao filme é incorrer no risco de, no futuro, querer tomar o trem para 2046.
“Espelho, espelho meu, existe diretor mais perfeccionista do que eu?â€
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