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A última cena de “Baarìa – A porta do vento” sintetiza perfeitamente o que o diretor Giuseppe Tornatore queria com seu filme: o que importa não é o jogo, suas regras, a vitória – ou, em termos cinematográficos, um senso de perfeição ou satisfação narrativa. Mas a vida. Que ela seja (sobre)vivida com liberdade e alegria, apesar de todos os revezes.
Baarìa é a terra natal de Tornatore e a terceira geração da família protagonista é centrada em um jovem cinéfilo claramente inspirado no diretor. O filme, portanto, é um álbum de reminiscências, uma obra pessoal e sentimental para o cineasta, que revisita causos e memórias para honrar sua família e, especialmente, o pai.
Apesar da escala épica, “Baarìa” é mais centrado em Peppino Torrenuova, inspirado no pai de Tornatore, sua luta sindical e participação no Partido Comunista. Pena que esse foco se dê às custas de outros personagens, como a mãe Mannina, que termina simplesmente uma mulher apaixonada e sem muita voz ou personalidade. A personagem fraca aliada à atuação ruim de Margareth Madè faz o romance entre os dois soar meio “Terra Nostra”, arrastando o miolo do filme.
Já quando o longa se torna político demais, principalmente em algumas megacenas (deslocadas) com vários extras e efeitos, temos a impressão de que já vimos aquela mesma história melhor contada nos filmes de Bernardo Bertolucci dos anos 60 e 70. Mas Peppino nos ganha aos poucos, graças à atuação de Francesco Scianna que vive o personagem por cerca de 50 anos e se torna mais convincente quanto mais velho ele fica. É nessa emoção autêntica e bastante italiana que a produção triunfa, apesar de seus muitos problemas narrativos.
E “Baarìa – A porta do vento” apresenta uma série de falhas. A mais sintomática delas é a presença de um fade out a cada 10 ou 15 minutos, denunciando o caráter episódico e fragmentado do longa. O roteiro é uma colcha de lembranças e casos de família: “como meu pai conseguiu se casar com minha mãe”, “a vez em que deitamos no chão molhado para aliviar o calor” ou “quando meu tio foi à farmácia comprar um remédio para morrer”.
Nada é muito amarrado e, por vezes, estórias como a primeira campanha eleitoral não têm uma conclusão clara. O que parece interessar a Tornatore é como (e por que) isso o marcou e, consequentemente, como (e por que) ele filma. É uma abordagem felliniana não totalmente bem sucedida: o início do longa é confuso e demora em ganhar o espectador, mas eventualmente a história engrena e ficamos mais acostumados com o formato.
No fim das contas, “Baarìa – A porta do vento” funciona quando é menos Fellini, Bertolucci ou “Terra Nostra” e mais Tornatore – filtrados os três, os 150 minutos do filme cairiam para uns 100 bem mais palatáveis. Quando o cineasta acerta a mão em um plano e bota a trilha de Ennio Morricone no fundo, não tem erro: a gente sabe que é um Tornatore falho, mas ainda assim emociona.