Moonrise Kingdom


Nossa avaliação

[xrr rating=4/5]

O novo filme de Wes Anderson é sobre reinício. Da encenação da Arca de Noé até chegar ao quase dilúvio da tempestade ao final, “Moonrise Kingdom” conta uma história de recomeços de seus vários personagens, o fim de uma certa ingenuidade que leva a um amadurecimento forçado. Mais do que isso, a obra é sobre a perda de inocência dos Estados Unidos.

Não é por acaso que a história se passe em 1965. Apesar de não haver nenhuma referência direta à Guerra do Vietnã, foi neste ano que tropas americanas desembarcaram no país asiático para tentar frear o movimento de insurgentes comunistas. Marco inicial de uma série de transformações na sociedade, o conflito parece uma sombra que permeia toda a narrativa, nos lembrando que aquela comunidade estática e bem organizada será dali a pouco colocada de cabeça pra baixo por movimentos contraculturais como os hippies, o feminismo, os protestos políticos.

A metáfora da orquestra, insistentemente lembrada durante todo o longa, é perfeita neste sentido: cada músico e cada instrumento possui seu papel bem definido e organizado, algo extremamente importante para o andamento correto da música. Mas esta estrutura bem definida (e que exemplo melhor de hierarquia e organização do que os escoteiros?) é ameaçada por dois quase adolescentes que resolvem fugir: um pintor/desenhista e uma fã de literatura fantástica. Os personagens racionais e coordenados de “Moonrise Kingdom” são confrontados com a emoção de dois jovens, a pulsão criativa do traço do desenho artístico que não segue regras, mas sim o instinto. É a vida pulsante que desestabiliza o sistema e traz o caos à ordem.

Em busca de novos caminhos.

Os dois são Suzy (Hayward) e Sam (Gilman), que de forma impensada fogem por uma paixão juvenil, colocando os pais da menina (Murray e Mc Dormand), o chefe dos escoteiros (Norton) e um policial (Willis) à sua busca na pequena ilha de New Penzance. Como é típico da filmografia de Anderson, o local serve como microcosmos para um estudo de caso de toda a sociedade (o binóculo que permite ver além das aparências) e mais especificamente, do amadurecimento dos adolescentes: da iniciação sexual à busca por identidade, “Moonrise Kingdom” conta complexas camadas de transformação abordadas a partir dos olhos de pré-adolescentes, repleto de metáforas visuais (como o brinco improvisado que Sam “penetra” em Suzy – que não tinha ainda a orelha furada).

Tudo contado com aquele típico humor melancólico do diretor e seu estilo próprio de quadros centrados e cores fortes. Mas aqui o visual não se sobrepõe ao tema, servindo para ajudar a compor a mensagem. A própria organização simétrica da mise en scène é importante para passar a ideia de organização social restrita, “imutável” daquela comunidade. Ao mesmo tempo a paleta de cores quentes (vermelho, alaranjado e amarelo) traz a emoção àquele ambiente exageradamente racionalizado.

Prato cheio para os fãs de Wes Anderson, “Moonrise Kingdom” pode acabar – como acontece com suas outras obras – causando estranhamento em quem não está acostumado com seu estilo e sua forma de humor. Mas merece uma chance pela delicadeza com que retrata de forma original um período de intensa transformação social. Saem os confrontos de passeatas contra policiais e mortos na guerra e entram dois pré-adolescentes fugindo por amor. Não é uma troca ruim.


Uma resposta para “Moonrise Kingdom”

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.

  • A gente
  • Home
  • Retro
  • Homeopatia
  • Overdose
  • Plantão
  • Receituário
  • Ressonância
  • Sem categoria
  • 2022
  • 2021
  • 2020
  • 2019
  • 2018
  • 2017
  • 2016
  • 2015
  • 2014
  • 2013
  • 2012
  • 2011